A função financeira nas empresas está em plena transformação. O avanço acelerado da tecnologia, com destaque para a inteligência artificial, a automação e o uso intensivo de dados, tem impulsionado a construção de um novo modelo operacional: o “touchless”, com processos digitais, inteligentes e mínima intervenção humana.
Esse movimento impõe às áreas financeiras o desafio de entregar mais valor com menos recursos, mantendo diferenciais competitivos e assegurando uma gestão de riscos eficiente. Ao mesmo tempo, surge uma janela de oportunidade com a reforma tributária, cuja implementação exigirá — e também impulsionará — uma reorganização estratégica e tecnológica das empresas.
Do modelo tradicional ao financeiro “touchless”
A nova estrutura financeira está sendo moldada pela combinação entre tecnologia, redesenho de processos e qualificação de equipes. O objetivo é suprir a carência de dados de qualidade, eliminar atividades redundantes e gerar inteligência com base em informações confiáveis.
Três engrenagens sustentam essa mudança:
- Processos inteligentes e digitalizados
Automatizam etapas como o ciclo de receita e o payroll, criando fluxos conectados e reduzindo custos operacionais.
- Inteligência artificial aplicada à gestão
Com IA preditiva e generativa, é possível automatizar relatórios, auditorias e gerar insights a partir de interações mais naturais com os dados.
- Novas competências profissionais
Com ferramentas analíticas mais acessíveis, os CFOs ganham protagonismo nas decisões estratégicas, como M&A, relacionamento com investidores, controles internos e gestão de liquidez.
Essa estrutura mais eficiente pode gerar ganhos expressivos: redução de custos em até 40%, aumento da produtividade em até 30%, e maior precisão nas análises — resultados essenciais para organizações que buscam agilidade e competitividade.
Reforma tributária: impactos e desafios para as finanças
A reforma tributária, que começa a ser implantada em 2026 e terá vigência plena em 2033, substituirá cinco tributos sobre o consumo (PIS, Cofins, ICMS, IPI e ISS) por dois principais — CBS e IBS — além de um imposto seletivo. A proposta busca simplificar o sistema tributário brasileiro, considerado um dos mais complexos do mundo.
Apesar da desejada simplificação, a mudança impactará profundamente a estrutura das empresas. Muitos negócios utilizam incentivos fiscais para manter margens e competitividade, o que exigirá revisão de estratégias. Além disso, será necessário adaptar sistemas e processos à nova metodologia de cálculo, baseada no valor líquido dos produtos e serviços.
Esse impacto será transversal. Departamentos como jurídico, compras, marketing, logística e manufatura também precisarão se alinhar para uma resposta coordenada.
Na área financeira, destacam-se quatro desafios centrais:
- Gestão de caixa: mudanças nos prazos de aproveitamento de créditos e a adoção do “split payment” exigirão novos controles e planejamento.
- Custos operacionais: será preciso investir em sistemas, adaptar rotinas e capacitar equipes.
- Relacionamento com stakeholders: a comunicação com parceiros e fornecedores precisará ser clara e estruturada.
- Estrutura de preços: a nova carga tributária exigirá revisão das políticas de precificação e margens.
Oportunidades da nova legislação
Apesar dos desafios, a reforma pode trazer benefícios importantes. A adoção do split payment, por exemplo, tende a aumentar a transparência fiscal e a confiança dos investidores. A modernização de sistemas e processos também representa uma oportunidade para tornar as operações mais seguras, integradas e eficientes.
Outro ponto relevante é a possibilidade de surgimento de novos programas de incentivo e reconhecimento a contribuintes em conformidade — um diferencial competitivo importante em um cenário de maior fiscalização e exigência regulatória.
A transformação digital da função financeira e a reforma tributária são movimentos complementares que exigem das empresas não apenas adaptação, mas visão estratégica. O papel do CFO torna-se mais relevante do que nunca, não apenas no compliance, mas como agente de criação de valor.
O futuro exige uma abordagem integrada, combinando tecnologia, dados e competências. É essa a chave para que a área financeira lidere — e não apenas acompanhe — a próxima fase de crescimento sustentável nas organizações.
Artigo escrito por Natalia Caliari e Bruna Felizardo, sócias da EY Brasil
