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Em quanto tempo poderemos ter uma recuperação consistente da economia? 

Assumindo que a pandemia esteja no final, sem uma grande interferência na economia e na hipótese de a absurda guerra não perdurar por muito tempo, pode-se considerar uma expectativa mais otimista, com redução significativa nos índices de inflação até o primeiro semestre de 2023 

Há algum tempo, a inflação de vários países, praticamente em âmbito mundial, tornou-se uma das principais preocupações, principalmente por parte dos bancos centrais de cada país. 

Ainda não nos desvencilhamos totalmente da pandemia de Covid-19, que poderá, ou não, recrudescer a qualquer momento, como o ocorrido em Xangai recentemente e, também, vivenciamos o conflito bélico entre Rússia e Ucrânia com seus impactos, sobretudo no preço dos combustíveis e de alguns produtos agrícolas, principalmente o trigo. 

Podemos observar as perspectivas econômicas sob vários aspectos, mas iremos nos concentrar no aspecto inflação que, estando elevada, gera a distorção dos preços relativos onde, além de seu efeito direto de cortar o poder de consumo das famílias, gera incertezas importantes na economia, desestimulando o investimento e, consequentemente, prejudicando o crescimento econômico.  

A inflação é uma velha conhecida dos brasileiros, porém, os americanos bem como a maior parte dos europeus, não possuem tanta afinidade com ela, desde o pós-guerra, mesmo que, por lá, principalmente nos Estados Unidos, esta não deverá desencadear um processo de recessão econômica, ao menos, não em médio prazo. 

Desta forma, analisamos as perspectivas de recuperação da economia em função das expectativas de tempo para a redução dos índices inflacionários elevados, no Brasil e no mundo. 

As origens “desta” inflação 

Inicialmente, se nos ativéssemos somente à redução da atividade econômica gerada pela pandemia, em todos os países, esta redução seria o suficiente para a elevação de custos, em toda a economia. Um dos fatores é a demora na recomposição das atividades, em especial, nas cadeias logísticas, após terem sofrido uma devastadora redução, ou mesmo interrupção, durante os picos da pandemia, em 2020 e 2021, com alguns picos mais localizados, no primeiro semestre de 2022.  Em outras palavras: “desativar estruturas é mais rápido e reconstruir é mais lento”. Houve redução ou desativação de equipamentos, de rotas, redução de escalas, demissão de pessoal treinado, entre outros. A retomada é lenta. A própria economia de escala alcançada pelo volume anterior das operações foi, em parte, perdida. 

 Adicionalmente, alguns dos fornecedores de material ou serviços deixaram de atuar. 

 Até este ponto, ainda não consideramos as elevações nos custos de energia e combustíveis, entre outros.  

Efeito nos transportes intercontinentais 

      Modal aéreo

No modal aéreo, experimentou-se, mundialmente, a simples redução da frequência em determinadas rotas e a desativação temporária de outras rotas, acarretando uma grande elevação no custo dos fretes aéreos e a incerteza para a precificação de produtos a serem exportados ou importados. 

 A Associação Internacional de Transporte Aéreo (IATA) divulgou dados sobre os mercados globais de carga aérea mostrando um crescimento mais lento em 2022, mesmo com a retomada. Pelo lado do mercado, interrupções na cadeia de suprimentos e restrições de capacidade, bem como uma deterioração das condições econômicas, provocaram uma readequação do setor, reduzindo a oferta. Com as demissões durante o auge da pandemia, houve grande perda de mão de obra qualificada, resultado em escassez de mão de obra na retomada. 

        Modal Marítimo

Para uma boa compreensão dos efeitos nesse modal, há uma distinção importante:  

– Contêineres (e navios porta-contêineres); 

– Navios graneleiros. 

 

Vamos retroceder ao início de 2022 de forma a entender os efeitos na logística, que ainda perduram, apesar de que em menor escala, porém a consequente elevação nos custos não retrocedeu ao patamar anterior. 

 

Com relação aos contêineres, um fluxo intenso no comércio internacional é o do corredor Ásia (China) – Estados Unidos. Houve grandes paralizações nos portos, durante o auge da pandemia, reduzindo a oferta de navios e contêineres. Além disso, como os picos da pandemia se deram em momentos diferentes em cada uma dessas regiões, isto também agravou a oferta de contêineres, uma vez que havia determinada demanda em um sentido, porém não a habitual no retorno. 

 

Em nosso caso específico, na América do Sul, houve um fator adicional: o fluxo de contêineres (oferta) foi extremamente reduzido, concentrando-se no hemisfério norte, onde transita o maior volume. Isso é natural, já que os maiores PIBs consistem em Estados Unidos, União Europeia e China – com um total de aproximadamente 65% do PIB mundial, sendo que o Brasil representa algo como 2%.  

Anteriormente à pandemia, em termos de economia de escala e redução de fretes, os navios passaram a ser maiores, carregando cerca de 18 a 19 mil contêineres. Supondo que o ponto de equilíbrio de um navio desses seja de 70% dessa carga, enquanto ele não atingir esse ponto de equilíbrio, dificilmente sairá do porto, em algum lugar do mundo onde ele estiver, apesar dos custos portuários. Durante o lockdown, isso gerou um aumento significativo dos custos, encarecendo os fretes em 5 a 7 vezes (ou mais), um novo patamar de valores que perdura até hoje. Adicionalmente, um fator agravante é o de que nem todos os portos brasileiros podem receber esses grandes navios, uma questão de infraestrutura que ocorre desde antes pandemia. 

 Adicionalmente, o cenário global logístico apresenta a tendência de alterações significativas, com as empresas tendendo a reduzir o papel da China de ser o “grande fornecedor global”, ou seja, mudanças significativas gerando alterações na operação, durante um período de acomodação ao novo cenário. 

 Já em termos de navios graneleiros, o comportamento é oposto, já que a China necessita importar as commodities do Brasil (soja, minério etc.). 

 Observar que são aspectos decorrentes da pandemia, sem ainda considerar a elevação no preço dos combustíveis. 

O tema dos contêineres ilustra adequadamente o fato de que, em cada segmento logístico, a “inércia da retomada das cadeiras logísticas” se deve, em parte, a um descompasso entre os recursos da estrutura anterior à pandemia, recursos estes que foram reduzidos e a recomposição deles, para uma readequação à demanda.  

 Esta questão de readequação à demanda, ou seja, de uma demanda pós pico da pandemia significativamente superior à oferta, que está se readequando, é uma das causas da inflação mundial. 

O gráfico, a abaixo, ilustra claramente essa questão, observando a elevação do frete, em US$/contêiner, de Xangai (Shangai) a Santos e de como esta rota foi afetada, acima das demais:


Fonte: Compilação CNI a partir de dados do China-Global & Shanghai Export Container Freight IndexDados até jul/2021


Efeito da guerra na ucrânia 

No mercado mundial de combustíveis, a guerra provocou um impacto direto, ante uma possível crise de oferta, uma vez que o mercado não esperava que o conflito se prolongasse por tanto tempo. Há sanções econômicas e ameaça de novas sanções de um lado e a ameaça de corte de fornecimento de gás carvão e petróleo por parte da Rússia. 

Mas, não só os combustíveis sofreram significativas altas nos preços, como commodities agrícolas, provocando um aumento global nos preços dos alimentos, além de ameaça de fome em algumas regiões da África. Tanto a Rússia como a Ucrânia têm papéis estratégicos nos mercados internacionais de produtos básicos. Ambos são grandes exportadores de produtos como trigo e cereais, petróleo, gás natural e carvão. 

Esses efeitos combinados desaceleraram a economia global. Trata-se de uma “guerra cara”, não só para os países envolvidos, em termos de vidas e recursos, mas, economicamente falando, para vários outros países, como os da Europa Ocidental, os Estados Unidos e, por fim, o mundo todo, provocando uma crise energética, alimentar e de investimento. 


Elevação nas taxas de juros 

 Necessidade de elevação nos juros para combater a inflação, o que não é bom nem para a economia brasileira, nem para a economia mundial. O Brasil, corretamente, se antecipou. Porém, o remédio tem seus efeitos colaterais, causando retração na economia; a questão mais importante é saber balancear dosagem. A inflação mundial deixou de ser um fenômeno de aumento de preços decorrente, exclusivamente, da pandemia, além do fato do círculo vicioso da inflação “desencorajar expectativas”, provocando a necessidade de apertos nas economias, trazendo a demanda para baixo. 

Novos aumentos de juros deverão ocorrer nos EUA, mesmo que de forma gradual, conforme sinalização do FED (Federal Reserve Bank) (isto também acarreta uma realocação mundial de investimentos). O Brasil e outros emergentes, no momento, assistem à combinação do aumento das taxas de juros nos EUA e da desaceleração econômica na China. 

O Banco Mundial revisa para baixo a maior parte das expectativas de crescimento do PIB dos países. 

 E, por fim, em quanto tempo poderemos ter uma recuperação consistente da economia? 

Por um lado, muitas Instituições e o próprio Banco Mundial sinalizam que poderemos ter uma redução no PIB para os próximos anos, ou seja, redução na atividade e em um ambiente de inflação.  

Pela ótica da inflação, se separarmos, conceitualmente, a origem dessa inflação, no Brasil e no Mundo, poderíamos considerar, separadamente: 

– A pandemia; 

– A guerra; 

– Sazonalidades; 

– Questões específicas dos mercados. 

 Sazonalidades e questões específicas dos mercados consistem em variáveis mais previsíveis. 

 
Assumindo que a pandemia esteja no final, sem grandes “repiques”, ou que aprendamos a conviver com este ou outros males, sem uma grande interferência na economia e na hipótese de a absurda guerra não perdurar por muito tempo, pode-se considerar uma expectativa mais otimista, com redução significativa nos índices de inflação até o primeiro semestre de 2023, podendo iniciar-se já nos próximos meses. Os preços dificilmente regrediriam aos patamares anteriores à pandemia, longe disso, porém se estabilizariam. O mundo estaria mais pobre, pela perda do poder aquisitivo das moedas, porém a atividade e os investimentos seriam retomados, gerando empregos, além da possibilidade de redução gradativa das taxas de juros.  

 

O artigo é de autoria de Jorge Augustowski, diretor de economia da ANEFAC com cold review de Roberto Vertamatti, conselheiro da ANEFAC. 

 

Roberto Vertamatti, conselheiro da ANEFAC
Roberto Vertamatti,
conselheiro da ANEFAC
Jorge Augustowski,
diretor de economia da ANEFAC

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