Em discussão no Senado, a proposta para a Reforma Tributária vem agitando o mercado. Segundo Roberto Fragoso, head de tributos da ANEFAC, a perspectiva de reformar o sistema tributário brasileiro existe há muito tempo, assemelhando-se a um “Frankenstein”. Contudo, questiona-se se esse “Frankenstein” poderia adquirir autonomia, deliberar, experimentar emoções e tomar decisões próprias. “Neste momento singular, testemunhamos a iminência de um projeto de lei de extrema complexidade, com o potencial de revolucionar a tributação sobre vendas. A perspectiva de uma reforma capaz de transformar substancialmente a estrutura tributária e o processo de arrecadação nos enchem de entusiasmo”. A Reforma Tributária na prática foi tema de um evento realizado pela ANEFAC em 25 de julho.
Na visão de Guilherme Dultra, head de finanças da ANEFAC e palestrante no encontro, há a necessidade de uma reforma tributária no Brasil, pois a atual carga tributária é alta e desproporcional, com um foco excessivo na tributação sobre o consumo. Ele compara isso a uma pessoa com sobrepeso que tenta emagrecer, mas continua consumindo a mesma quantidade de calorias que a levou ao sobrepeso.
Ele destaca cinco elementos essenciais para um sistema tributário justo e eficaz: equidade, simplicidade, estabilidade, baixo custo de conformidade e neutralidade econômica. “A reforma tributária em discussão deve priorizar a simplicidade e a transparência, além de reduzir os custos de conformidade. Ela é crucial para transformar a realidade social do país e ressalta que a tributação sobre o consumo e bens deve ser revista para alcançar uma maior equidade no sistema tributário.”
Na mesma linha, Rodrigo Reis, diretor de impostos na 99, reconhece a importância dessa reforma não apenas para o cenário tributário, mas para toda a sociedade, visando uma tributação mais equitativa e menos regressiva. “Temos ainda a complexa questão do desemprego e da informalidade decorrente do aumento da carga tributária. Além disso, a simplificação do sistema tributário e a redução do litígio foram tópicos relevantes”. Para ele, a reforma tributária pode criar um ambiente de negócios mais favorável no Brasil, atraindo investidores e impulsionando o desenvolvimento do país. Para isso, deve-se priorizar a simplificação, a redução de litígios e uma carga tributária mais sensata.
Por outro lado, Marco Castilho, diretor de tax na Basf, vê a questão da reforma tributária como algo acessório ou periférico. Principalmente, essa questão está relacionada com o cálculo interno, uma vez que hoje em dia, basicamente, raramente existe um sistema capaz de calcular todos os impostos federais, estaduais etc. É necessário ter vários sistemas para estar em conformidade. Em sua visão, essa é uma das partes positivas da reforma, que pode promover avanços significativos no país. “Um dos aspectos positivos da reforma é a expectativa de tornar a conformidade tributária mais eficiente.”
Quanto à parte material da reforma, que envolve novos tributos, princípios, bases de cálculo, formas de cobrança, fiscalização, entre outros aspectos, Castilho acredita que seja um terreno um pouco mais nebuloso. “Teremos que aguardar para ver como isso será delineado após a proposta passar pelo Senado e ser promulgada. Muito dependerá dos operadores do sistema, do governo federal, do governo estadual e da posição do judiciário”. Em relação a esse princípio do destino, ele avalia que pode haver uma espécie de guerra fiscal invertida, e o judiciário terá que lidar com novas questões. Inclusive, como as empresas, indivíduos e advogados vão operacionalizar essas mudanças também é uma incógnita. “Vale lembrar que o sistema tributário atual já foi bom em seu início, mas foi deturpado ao longo dos anos. Veremos como os operadores se adaptarão a essa nova tributação. Além disso, a competência tributária não mudará, com os estados, o Distrito Federal e a União mantendo sua autonomia tributária. As leis brasileiras frequentemente utilizam conceitos indefinidos, o que leva a muitas discussões e interpretações diferentes. Será interessante observar como o judiciário se posicionará em relação a esses pontos.”
Infelizmente, o Brasil não pode abrir mão da arrecadação, uma vez que precisa financiar projetos sociais e manter o funcionamento do Estado. Analisar uma reforma tributária comparativamente ao presente pode ser um dos maiores equívocos, de acordo com Gustavo Alves, diretor de impostos na Tim. Ele argumenta que, em vez de focar no futuro, como é geralmente proposto em reformas, é fundamental concentrar-se nas imperfeições do presente. Alves destaca que, ao considerar a carga tributária total, não estamos muito distantes da média. A questão da conformidade tributária é inegável e, para ele, a reforma é inquestionavelmente necessária.
Ele observa que ninguém discorda da necessidade de reforma, especialmente quando se trata das áreas tributárias das empresas, que sofrem devido à conformidade e ao controle das contingências. Alves ressalta que os valores das contingências tornam a administração tributária complicada, especialmente para investidores estrangeiros em empresas multinacionais, que ficam perplexos ao ver as controladoras das empresas questionando como é possível lidar com o nível de contingências existente no Brasil.
Portanto, Alves enfatiza que a busca por melhorias por meio dessa reforma deve estar intrinsecamente ligada à segurança. Ele acredita que a previsibilidade é uma das principais expectativas em relação a essa reforma. “O tributo não pode ser uma contingência, não pode ser imprevisível e não deve representar um risco para as empresas, ameaçando as operações do negócio. Tributação não pode ser um fator de risco. A grande questão desta reforma tributária é eliminar as muitas incertezas, especialmente questões antigas, como créditos tributários e a definição de quais tributos são devidos. Essas questões não podem mais ser tratadas com incerteza. Quando se trata de atividades empresariais plenas, esses pontos devem ser princípios fundamentais, fora de qualquer debate.”
É imperativo evitar que a tributação se transforme em um elemento de risco para as empresas, minando a competitividade em um ambiente empresarial saudável. O objetivo principal é alcançar um equilíbrio e reavaliar setores específicos que desempenham um papel estratégico significativo. Coerência é a palavra-chave nesse contexto. O sistema tributário deve ser moldado com propósitos claros e razoáveis. Para ilustrar, consideremos o caso dos incentivos fiscais regionais, que têm um propósito fundamental: atrair empresas para áreas com desafios econômicos particulares. “Quando conseguimos estabelecer esse equilíbrio, os incentivos fiscais se tornam progressivos e adquirem uma lógica incontestável. Acredito que a coerência dessa reforma, dentro do contexto de segurança, trará o que esperamos. Agora, na próxima etapa do Senado, esperamos que o processo de transição seja razoável, permitindo que as empresas se programem adequadamente”, finaliza Alvez.