Para quem acha que o Metaverso é uma realidade distante ou que se trata de mais um game de ficção da vida está na hora de virar ao averso este pensamento
Um clássico exemplo ilustrativo para corroborar com a afirmação, é a venda de um terreno virtual, próximo a residência NFT (código de autenticação virtual de originalidade) do Snoop Dog no Metaverso. O “objeto”, comprado por £ 340.000 libras esterlinas, foi adquirido por um fã anônimo, segundo o jornal britânico Independent. O novo vizinho do rapper pode agora se auto-intitular, Snooper, um cidadão do Snoopverse.
O Metaverso é a representação digital da realidade e integra a web3, a evolução da internet, composta pela internet das coisas, inteligência artificial, realidade aumentada e digital twin (uma representação virtual de um objeto ou processo físico em tempo real), além de outras tecnologias emergentes, e blockchain para registrar informações.
Dá para imaginar quantos cripto-milhões já estão circulando nesta fonte renovável de recursos ad eternum?
Saúde Mental controversa
Estudos recentes mostram que 50% das pessoas afirmam “depender da tecnologia para se sentirem bem”, enquanto quase 80% delas dizem que “tanto a vida social, quanto suas atividades diárias dependem da tecnologia para existir”. Esses dados constam no relatório Into the metaverse, encomendado pela agência global Wunderman Thompson, que além de ouvir pessoas nos mais diversos países, contou com 15 especialistas para analisarem o comportamento e tendências de consumo.
Um mundo controverso
Uma convergência entre os dois mundos, não uma dissociação, é o que se propõe o Metaverso, numa associação de hábitos, negócios, locais virtuais, lazer. Contudo, por trás de todo avatar tem um cidadão real com suas dores, emoções e sentimentos, dúvidas, angústias e prazeres.
“Esta realidade imersiva será ainda muito mais profunda, do que vivenciamos hoje com as redes sociais”, explica Christiane Edington, conselheira da MCIO Associação que promove a inclusão e ascensão de mulheres no mercado de tecnologia, uma das principais executivas de TI brasileiras.
“A tecnologia pode ser usada em prol de aspectos positivos da experiência humana, de virtudes como ética, bondade, compaixão. O problema vem ao tentar subverter o uso da tecnologia, perdendo a mão entre necessidades e valores da população imersiva, e os interesses das Big Techs, dado o alto potencial de negócios e audiência em jogo”, ressalta a executiva.
Sabe-se que as redes sociais já representam um fator estressor significativo para a saúde mental de pessoas reais, por fatores como geração de expectativa, comparação e ansiedade.
Quão impactante pode ser, vestir a roupagem de um eu-digital, que pode ser exatamente quem você é, ou pode ser alguém completamente diferente, numa experiência perceptiva muito mais intensa do que na web tradicional? Ajuda ou aliena o ser real?
Felicidade, ciência e tecnologia
A intersecção entre felicidade e tecnologia num contexto tão disruptivo deixa muito pano pra manga. Não é necessariamente um conceito novo, sustentar a vida em propósito, amizades e auto alquimia. Filósofos, antes de Cristo, já defendiam premissas semelhantes. A diferença é que, nos últimos 40 anos, cientistas comportamentais como Mihaly Csikszentmihalyi, Martin Seligman entre outros contemporâneos como Sonja Lyubomirsky, trouxeram à luz da ciência o importante entendimento não só do que nos faz felizes, mas de como treinarmos para fazer deste um hábito.
Recriar as vivências humanas através de um eu-imersivo num ambiente que se propõe a estar 24 horas por dia em modo on está longe de encontrar lastro de sustentabilidade psicológica que sustentem essa experiência.
Uma pergunta que deve ser feita é: o que os entrevistados do estudo “Into the metaverse” entendem por felicidade? Seria diversão, conquistas rápidas, prazeres hedônicos (intensos, mas de rápida duração)? Ou será que de fato reportaram ao entendimento superior e atualizado da felicidade, evidenciada pela ciência? O que responderíamos se tivéssemos feito parte da pesquisa, e o que de fato estaríamos comunicando com nossas afirmações?
Já identificamos um propósito longevo, um bem-estar subjetivo duradouro a despeito dos acontecimentos ao nosso redor? Já compreendemos que a base de uma vida feliz são conexões sociais qualitativas, altruísmo, imperturbabilidade, tudo isso bem equalizado com emoções positivas? Afinal, são esses os pilares de uma vida duradouramente feliz.
Numa das frentes emergentes mapeadas pelo já citado relatório, nas MetaSocieties (ambientes controlados de estudos): 88% dos entrevistados disseram que o seu eu-digital deverá refletir os seus valores da vida real e os seus preceitos éticos. Seria este um dado indicador de esperança para a construção de uma sociedade virtual mais positiva, justa e feliz?
De acordo com a Meta (Facebook), em suma, o Metaverso é a expressão máxima da tecnologia social, contribuindo para o bem-estar mental e que negar seria “propagar campanha anti-digital”. A resposta a esta afirmação veio do renomado Psychology Today, através da Dra. Phil Reed, Ph.D., professora de psicologia na Swansea University:
“Estudos sugerem que o uso excessivo da tecnologia digital está associado a muitos problemas de saúde mental, como sintomas psicossomáticos, depressão, e doenças mentais graves. Para que este esboço das evidências não seja confundido com propaganda anti-digital, como foi posto por representantes do Facebook, a primeira coisa a dizer é que existe a possibilidade de que tal interação virtual ajude pessoas a lidarem com a situação de delírios e alucinações, demonstrados em ensaios clínicos controlados. No entanto, o Metaverso não será um ambiente clínico controlado, e há sugestões factíveis de que a única ajuda que tais ambientes virtuais proporcionam ao bem-estar, é simplesmente escapismo, ou seja, promovem a sensação de escapar de problemas, não entregando uma solução duradoura. Por outro lado, existem evidências crescentes de uma associação entre o uso digital e problemas clínicos associados a delírios e alucinações.” (em livre tradução).
Segundo relatou uma participante do grupo de testes do Horizon Worlds, plataforma Metaverso do Facebook, ela teria sido assediada sexualmente por um dos participantes, afirmando que o fato de estar em realidade virtual, adiciona um componente de intensidade ao evento, não presente na internet convencional, relato publicado pelo jornal New York Post.
Entre controvérsias e fatos concretos, o melhor é estar munido de conhecimento para fazer escolhas mais assertivas, ainda que sejam cheias de dúvidas imersivas, para já começar a adjetivar em Metaverso.
Este artigo foi escrito por Sandra Teschner, que é empreendedora social, palestrante, especialista em Felicidade, Certified Chief Happiness Officer, e fundadora do Instituto Happiness do Brasil.