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SPACs (Special Purpose Acquisition Companies) verde-amarelos: quais são as possibilidades de aplicação no Brasil? 

Muito se fala atualmente daquela modalidade de investimento e abertura de capital que representou a maioria das IPOs nos Estados Unidos em 2021: as SPACs, abreviatura de Special Purpose Acquisition Companies (companhias de propósito específico para aquisições).  

As SPACs são companhias que nascem sem uma operação definida e são formadas usualmente por gestores reconhecidos pelo mercado. Elas são constituídas e ‘abrem’ seu capital ainda sem operações e sem definição dos investimentos pretendidos.   Na abertura do seu capital (IPO, pela sigla em inglês, já plenamente adotada no Brasil) levantam fundos a serem investidos em aquisições de outras empresas. Por isso são também chamadas de ‘companhias de cheque em branco’, aludindo à confiança dos investidores, que colocam seu capital via IPO numa empresa que pode ainda não ter definido exatamente quais outras empresas a SPAC vai adquirir ou às quais poderá se fusionar. 

Mas o regime não é tão livre assim. Na regulamentação norte-americana, as companhias SPACs tem de depositar os fundos levantados no mercado em contas de movimentação restrita, cujos recursos a Administração só terá acesso para as aquisições que constituem a finalidade específica delas. Deve-se também levar em conta que as fusões e/ou aquisições têm de ser aprovadas em assembleia de acionistas, o que dá um poder extra ao investidor que chegou via IPO. Além disso, as SPACs têm um prazo de dezoito meses a partir da abertura do capital para fazer as fusões ou aquisições pretendidas. Este prazo pode ser estendido para 24 meses, por motivos que precisam ser muito bem justificados perante as autoridades do mercado. Se as fusões/aquisições não acontecerem dentro desse período, os fundos devem ser reembolsados aos investidores, acrescidos dos respectivos rendimentos. Ou seja: os únicos a sofrer prejuízos serão os fundadores, gestores iniciais. 

Para corroborar o sucesso desta forma de organização, vale mencionar que o número de IPOs de SPACs nos Estados Unidos passou de 59 em 2019, para 247 em 2020 e para 613 em 2021. Mesmo que os últimos dois anos tenham sido ‘golpeados’ pelas consequências econômicas da pandemia de Covid-19; as SPACs movimentaram muito capital. Até julho de 2022, porém, somente 70 SPACs abriram o capital nos EUA. É preciso esclarecer que, necessariamente, os impactos da inflação inusitada naquele país e as consequências da guerra Rússia-Ucrânia devem ter muito a ver com esta súbita diminuição. Não obstante, arrisco dizer que este movimento de baixa será revertido e que as SPACs serão bastante ‘populares’ no futuro. 

Agora é hora de perguntar: é possível constituir uma SPAC no Brasil e ‘abrir o capital’? Não há qualquer disposição na Lei das Sociedades por Ações nem na regulamentação do mercado aberto que impeça este movimento. Deve-se pensar se o fato de as demonstrações financeiras cobrirem um período curto de ‘atividades’ pode representar um problema, já que os potenciais investidores não teriam como avaliar a qualidade dos ativos, nem a rentabilidade das operações, nem a conduta daqueles encarregados da governança corporativa. É por isso que, nos EUA, estas companhias recebem usualmente recursos de investidores qualificados, que conhecem bem os gestores que abriram a companhia e que procurarão empresas para adquirir. 

É claro que, não havendo ainda no Brasil regulamentação específica que ofereça as travas e garantias do sistema norte-americano acima resumidas, restaria saber se haveria investidores dispostos a tomar o risco. Também pode-se perguntar se seria possível registrar na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) uma companhia nessas condições (constituída de um único ativo: caixa e equivalentes, e um único item do patrimônio líquido: capital social). 

Mas nem tudo está perdido: entidades ligadas às companhias de capital aberto estão trabalhando em conjunto com a CVM para que seja criada, no Brasil, uma regulamentação específica para as SPACs ‘verde-amarelas’. Se este tipo de sociedade ‘vingar’ por aqui, será mais uma oportunidade de investimentos, além de necessariamente movimentar a atividade de fusões e aquisições (M&A, pela sigla em inglês de mergers and acquisitions). 

Artigo escrito por Ricardo Rodil, que é head capital markets na Crowe Macro Brasil 

Ricardo Rodil, head capital markets na Crowe Macro Brasil

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