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Economia brasileira ainda gera dúvidas e carece de medidas mais efetivas 

Em abril, o presidente Lula, no seu terceiro mandato, completou 100 dias do seu governo. Em termos de promessas de campanha, o principal foco foi a área social com a volta de programas como o Bolsa Família, Mais Médicos e outros.  

Na área econômica, o presidente tem tecido fortes críticas ao Banco Central sobre a taxa básica de juros, a Selic. No fim de março, anunciou a proposta de nova regra fiscal para substituir o atual teto de gastos e controlar os gastos públicos.  

Decidiu reajustar o salário-mínimo, de R$ 1.032 para R$ 1.320, a partir de maio. Também anunciou o reajuste da tabela do Imposto de Renda (IR) para pessoas físicas. A partir de maio, a faixa de isenção do IR será ampliada, de R$ 1.903,98 – em vigor desde 2015 – para R$ 2.112. 

Já em termos de meio ambiente, assinou um decreto para a retomada do Fundo Amazônia – mecanismo que usa aportes bilionários de outros países para financiar projetos de preservação ambiental. 

Outro destaque desse governo, são as viagens internacionais para estreitar relacionamento e negócios com vários países. Já com relação a construir uma base de apoio robusta no Congresso, o governo ainda não conseguiu efetivamente formar uma.  

No dia 12 de abril, a ANEFAC realizou um evento intitulado “100 dia do governo”, em São Paulo. Confira abaixo a avaliação dos especialistas convidados da entidade para palestrar no encontro.  

Análise de Wellington Gusmão, sócio na Hold Investimentos:  
100 dias de mais estado na economia 

Em 100 dias, o novo governo Lula demonstrou que sua prioridade é retomar o papel historicamente preponderante do Estado na condução da economia brasileira. Embora geradora de graves crises no passado, essa ideia é tentadora demais para ser descartada por nossos políticos. Apesar de parecer óbvio agora, à época da campanha ainda havia esperança de que Lula aceitaria dialogar com o mercado. Não. Ele não quer fazer as coisas como no “Lula 1” e prefere seguir o caminho apelidado como “Dilma 3”.  

Vamos aos fatos. Durante a campanha política do petista em 2022, quem acreditou que haveria maior diálogo com a iniciativa privada agora testemunha ataques quase que diários às bases da economia liberal e, em alguns casos, a reversão de decisões institucionais importantes. Dois exemplos disso foram (1) a decisão do STF em relação a coisas julgadas em matérias tributárias – basicamente, não se pode mais confiar que uma causa ganha nessa corte, a última instância da justiça brasileira, não sofrerá alteração posteriormente – e (2) nas mudanças no Marco do Saneamento à canetada e sem consulta, ajudando empresas estatais incompetentes a voltarem a ter voz ativa no setor. Absurdo por absurdo, em ambos os casos, a iniciativa privada sofreu um duro golpe.  

No entanto, destaca-se que, pela ótica do governo, todas essas medidas, embora gerem excesso de ruído e mais insegurança jurídica para as atividades privadas, foram positivas ao se alinharem à agenda histórica do PT de intervencionismo estatal com vistas a induzir crescimento econômico financiado por gastos públicos crescentes. Resta, porém, combinar o jogo com a iniciativa privada e com o cenário externo desfavorável. Inclusive, do lado das derrotas governistas, temos: (1) o Congresso está realmente mais difícil de cooptar do que em outros tempos, (2) o desembarque de figuras importantes do mercado financeiro indica que aquele outrora bom relacionamento esfriou e (3) a dificuldade em se coordenar ações de governo com ministros e uma base congressista tão heterogêneos. 

Do ponto de vista estritamente econômico, tivemos de positiva a elevação do limite de isenção da tabela do Imposto de Renda. Não se trata de uma revisão completa das faixas de contribuição, mas aliviará bastante o bolso de quem ganha até R$ 2.640,00. Em ponto neutro está o novo arcabouço fiscal proposto por Fernando Haddad que, se aprovado como está, pelo menos impõe algum limite ao crescimento de gastos do governo. Por que isso não é positivo? Porque a nova regra é demasiadamente flexível e sugere compensar gastos com aumento na arrecadação – embora não se fale em aumento de impostos e, sim, em mexer nos setores que não pagam impostos ou que recebem grandes subsídios, é muito difícil que aumentos não aconteçam, dado que o potencial das novas fontes de arrecadação seja facilmente contestado por matemática básica e que brigar com determinados setores subsidiados não parece ser uma boa decisão política.  

Do lado negativo, temos a discussão sem freios entre Lula e Roberto Campos Neto, Presidente do Banco Central do Brasil. Após o anúncio do novo arcabouço, finalmente vimos os ânimos se acalmarem, mas o tempo perdido e o ruído gerado foram prejudiciais à economia em um nível que beira o amadorismo. Não se pode impor uma taxa de juros ao mercado – isso já deveria estar claro aqui no Brasil. A taxa de juros precisa cair sim, mas seguindo critérios técnicos e razoáveis. A inflação está caindo? Sim, mas o argumento é falho. Ela cai, mas não ao centro da meta que o Banco Central precisa perseguir por mandato. Infelizmente o novo governo não se preocupa tanto com inflação mais alta, pois sua linha de pensamento econômico enxerga a inflação como sinal de crescimento e, convenhamos, ajuda a aumentar a arrecadação. 

Por fim, há dois cenários bem definidos para os próximos anos no Brasil: (1) fatores externos, como boom de commodities, causaria crescimento econômico e ajudaria o governo a parecer responsável e bem-sucedido em suas políticas ou (2) uma recessão global mais forte do que o previsto atingiria o Brasil e seria o gatilho para que houvesse desarranjo em todas as variáveis importantes – PIB, desemprego, inflação, juros e equilíbrio fiscal. É natural imaginar que mais gastos públicos impulsionariam a economia, lançando as bases para um terceiro cenário em que o Brasil reuniria internamente os ingredientes para um crescimento independente. No entanto, a reversão (e aversão) das políticas liberais, as contas públicas já deterioradas, o alto endividamento das famílias e os eventos econômicos externos desfavoráveis que se avizinham são fatores que pesam contra a existência desse terceiro cenário. No máximo, portanto, o intervencionismo do governo mais uma vez teria efeito limitado e efêmero sobre a economia.  

Sendo assim, a conclusão é que as políticas econômicas do novo governo tendem a colocar mais peso sobre os ombros dos contribuintes brasileiros. As tentativas de se induzir crescimento com mais gasto público geram alocações ineficientes de capital e grande morosidade na execução das obras. Isso é claro. Porém, mesmo que haja crescimento, provavelmente não será na velocidade necessária para gerar o fluxo financeiro que bancaria esses projetos. A consequência: o governo jura não querer elevar as taxas de impostos, mas o simples fato de taxar novos setores e retirar subsídios de outros acresce mais carga tributária para a sociedade como um todo. Vamos então sair do recorde de quase 34% de carga tributária sobre o PIB para qual percentual? O céu é o limite? E pior: o tiro vai ser dado contra o setor produtivo da economia. Sim, pois a retirada de subsídios afetará o financeiro de várias empresas. Até mesmo a reforma tributária, ainda sendo desenhada, gera pânico em várias empresas pelo Brasil. É louvável que queiramos fazer esse tipo de reforma, mas as bases política e teórica por trás desse desenho precisam seguir o racional de destravar os setores produtivos e reduzir o peso do Estado. O atual governo provou, em 100 dias, que definitivamente não está seguindo esse racional.    

Visão de Vandyck Silveira, head de economia na ANEFAC e co-founder da EducPay: 
Os primeiros cem dias de uma noite de quatro anos! 

Lula foi eleito em novembro de 2022, teve dois meses para elaborar um plano econômico, que deveria ter sido feito antes da eleição, foi empossado, e somente três meses após ter assumido a presidência, e aos trancos e barrancos, se dignificou apresentar um novo Arcabouço Fiscal.  A Ancora Fiscal é necessária para nortear o país, e o mercado, quanto a possibilidade de o país conter o avanço da dívida pública, que somente em juros, consumirá em 2023 mais de R$650 bilhões, frear a inflação e oferecer um espaço para investimentos públicos. 

A Ancora, saiu manca, um projeto com pouca possibilidade de ser executado por depender quase que integralmente de receitas, muitas extraordinárias quando o mundo flerta com a recessão, e outras sem a menor ideia de onde virão, seguida por platitudes sobre “zerar o déficit” em 2025, e produzir um superavit primário em 2026.  Se trata, basicamente, de um “bingo de palavras fortes” para acalmar o mercado, sem uma parte crucial do plano, que é o COMO!  

Esses cem dias são marcados por uma profunda desorganização entre as equipes, uma série de idas e vindas como o desastre do limite máximo de juros para o crédito consignado dos pensionistas da previdência, que evidenciou a descoordenação e o improviso do time, e que fez cessar em minutos após o anúncio a oferta dessa modalidade de crédito, o que forçou o governo a cancelar a medida. 

Nesse início de mandato, observamos um descontrole verbal do presidente que provocou um embate público com o presidente do Banco Central sobre a taxa de juros, mostrando um despreparo do Lula para lidar com a independência de uma autarquia que faz parte do jogo democrático, e que o próprio Lula criticava nas ações de Bolsonaro.  A briga gerou uma profunda desconfiança por parte do mercado, e o BOVESPA despencou abaixo dos 98 mil pontos. 

Porem, a bateção de cabeças não termina ai, ao falar publicamente sobre a PETROBRAS e da formação de preços do petróleo e seu derivados, Lula, e seu homem de confiança na cadeira de CEO, Jean Paul Prates, se mostram despreparados e guiados por ideologia ao contestar e promover uma ruptura com o PPI, que na gestão Dilma foi responsável por bilhões em prejuízos por não repassar o valor do preço do mercado internacional para a empresa como forma artificial de conter a inflação, e de usar a empresa como ferramenta de política do executivo.   

Por incrível que pareça, tudo isso nos leva crer que Lula não aprendeu nada! Quando pensamos que tudo isso foi somente o começo, nos enganamos, porque tem muito mais!  Lula interferiu na Lei do Saneamento Básico para dar evidente privilégios a empresas estatais comparado com as empresas privadas do setor ao abolir a exigência de licitação para a contratação dos serviços de empresas públicas.   

Também alterou a Lei das Estatais para permitir que políticos sejam conduzidos a cargos de gestão através do bom e velho apadrinhamento político, ao invés de manter as exigências de conhecimento e experiencia na área como seria de se esperar de um modelo de governança probo.   

Flertou com uma ideia irresponsável e sem base econômica de formar uma moeda única com a Argentina.   

Contudo, o ápice dos desmandos, não estão nos erros e trapalhadas econômicas que eu fiz uma lista parcial acima, ele se concentra na área política mesmo.   

Lula foi gravado em vídeo falando publicamente que as “coisas estarão boas com eu f@#er o Moro”, somente para no dia seguinte a Polícia Federal desbaratar um plano do PCC para assassinar pessoas públicas incluindo Sergio Moro.  Porém, como se isso não fosse ruim para a reputação e do presidente e uma total falta de decoro para com o cargo, Lula teve a coragem e desfaçatez de promover uma notícia falsa de que Moro teria criado essa narrativa para se promover, algo indefensável e muito mais sério quando vindo do presidente. 

Esses cem primeiros dias de governo Lula III se tornaram o prologo de um mandato que tem um pacto macabro com o atraso e com o retrocesso, norteado por ódio e negacionismo de fatos que ocorreram e levaram o presidente a cadeia e a uma caçada à corrupção, que foi imoralmente desligada da tomada por pessoas e poderes republicanos que tem muito a explicar, mas também têm o privilégio político de se protegerem da luz da justiça e fazer tudo ficar como sempre foi.   

Perspectivas de Gennaro Oddone, conselheiro na ANEFAC e sócio na Auto2You:  
Cenário aponta que não haverá grandes avanços na economia para este ano 

Passados 100 dias do novo governo e, até o momento, não tivemos nenhum avanço na economia e em nenhuma outra área do governo. Estamos assistindo um governo que não conseguiu sequer obter coesão de sua equipe com as principais lideranças do partido. 

Sem nenhuma nova proposta, foi recriado programas sociais do passado: Bolsa Família (2003), Minha Casa Minha Vida (2009) e Mais Médicos (2013). Porém, isso não trouxe nenhum impacto, uma vez que são programas já existentes que de alguma forma foram preservados nos governos posteriores. 

Para área economia foi apresentado um novo arcabouço fiscal que o principal fundamento é o acréscimo da carga tributária, através do aumento das alíquotas dos impostos já existentes. Com este movimento, o governo espera arrecadar R$ 150 bilhões adicionais. De concreto nenhuma proposta foi feita que objetiva reduzir gastos e ou aumentar produtividade da máquina pública. 

Outro problema são os constantes ataques ao presidente do Banco Central, pressionando para que haja uma redução na taxa de juros básica. Já vimos esse filme no passado e o resultado foi desastroso. Isto não significa que não poderia haver uma discussão madura sobre este assunto.  

Com esse cenário, não podemos esperar grandes avanços na economia para este ano. 

Da esquerda para direita, Bolí Rosales, Gennaro Oddone, Wellington Gusmão, David Kallás e VanDyck Silveira

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